Extracto Acta
Aos dia sete de Julho de dois mil e quatro, reuniu a Segunda Secção do Júri de Ética Publicitária, que apreciou o processo nº 14J/2004, tendo deliberado o seguinte:
«Processo nº 14J/2004
1. Objecto dos Autos
1.1. A PT - COMUNICAÇÕES S.A. (adiante abreviadamente designada por PT), apresentou queixa ao Júri de Ética Publicitária do ICAP (adiante abreviadamente designado por JEP) relativamente a uma campanha publicitária da responsabilidade da NOVIS-TELECOM S.A, (adiante abreviadamente designada por NOVIS) por, no entender da queixosa, tal campanha violar o disposto nos artigos 9º, 10º, 11º e 16º do Código da Publicidade (CPUB), no artigo 6º do Decreto – Lei 138/90 e nos artigos 9º, 14º nº1 b) e 15º do Código de Conduta do ICAP (CCI), bem como recomendações relevantes deste Instituto.
Tendo sido notificada para o efeito, a NOVIS apresentou contestação.
Dão-se por reproduzidos a queixa, a contestação e os documentos juntos pela partes.
1.2. A campanha em causa diz respeito ao produto “Voz Teledesconto Relax” e é veiculada em caixas (cfr. Doc. 1 junto com a queixa) expostas para venda nas lojas WORTEN, as quais contêm a proposta de adesão ao serviço em causa, as condições de prestação do serviço, um folheto explicativo, um envelope RSF e um brinde NOVIS; em folhetos (cfr. Doc. 2 junto com a queixa) que a NOVIS faz distribuir nas mesmas lojas, bem como no site http://www.novis.pt/article/articleview/130/1/19/ (cfr. Doc. 9 junto com a queixa).
Nas faces das referidas caixas consta a seguinte afirmação: 1 ano grátis de chamadas locais à noite, fins de semana e feriados nacionais, para além de outros enunciados de nula relevância para o caso sub judice, como as instruções de activação do serviço em causa e a metodologia de facturação.
A NOVIS faz ainda distribuir, nas mesmas lojas WORTEN, um folheto relativo ao mesmo serviço onde se pode ler, entre outras menções, 1 ano grátis de chamadas locais à noite e fim de semana.
No site da Internet acima referenciado pode ler-se o seguinte: Por apenas € 25, beneficia de 1 ano totalmente grátis de chamadas locais à noite (dias úteis das 21h às 9h), fins-de-semana e feriados nacionais (valor a pagar na primeira factura); é sempre mais barato que a PT Comunicações porque pode fazer chamadas locais à noite, fins-de-semana e feriados nacionais sem restrições… estas são totalmente grátis; o preço das restantes chamadas é igual ao tarifário base da PT Comunicações, para além de outras menções de nula relevância neste contexto.
1.3. Em síntese, a PT fundamenta a sua queixa nos seguintes termos:
A mensagem publicitária em causa nos presentes autos é susceptível de induzir em erro os seus destinatários e é, por consequência, enganosa, pelos seguintes motivos:
- CAMPANHA DA NOVIS DIFUNDIDA NAS LOJAS WORTEN
Sendo certo que em todos os materiais supra citados consta a afirmação 1 ano grátis de chamadas locais à noite e ao fim de semana, “(…) em parte alguma desta campanha publicitária se indica que esta caixa, disponibilizada nas lojas WORTEN, custa € 25.” (art.º 27º da queixa), o que, para além de contrariar o disposto nos arts. 1º e 6º de Decreto-Lei nº 138/90, consubstancia publicidade enganosa, tal como prevista no art.º 14º do CCI, induzindo, assim, o consumidor em erro. Tal é confirmado, na opinião da PT, pela factura /recibo nº 515018697, de 3 de Maio de 2004, que junta à queixa, da compra do produto em causa pelo consumidor Rui Manuel C. Carvalho, onde consta o preço liquidado de € 25.
- CAMPANHA INTERNET
A mensagem veiculada consubstancia publicidade comparativa enganosa, nos termos previstos no art.º 15º do CCI e no nº 2 do art.º 16º do CPUB, na medida em que a promessa constante do referido site de que é sempre mais barato que a PT Comunicações porque pode fazer chamadas locais à noite, fins-de-demana e feriados nacionais sem restrições… estas são totalmente grátis se não compagina com a afirmação de que este serviço tem um custo de € 25, induzindo, assim, o consumidor em erro.
Por outro lado, as regras definidas no Decreto-Lei nº 138/90, em especial a referência a taxas e impostos, não são acatadas..
1.4. A NOVIS contesta dizendo, em síntese, o seguinte:
- CAMPANHA DA NOVIS DIFUNDIDA NAS LOJAS WORTEN
A compra de qualquer produto exposto nas prateleiras das lojas WORTEN ou de qualquer outra loja implica um custo de aquisição. O preço do serviço em causa, “Voz Teledesconto Relax”, encontra-se afixado em etiquetas, nos locais de exposição, de acordo com a lei, sendo certo que a responsabilidade desta afixação cabe à cadeia WORTEN. Acresce que esta cadeia utiliza, para além dos materiais referidos pela PT, um cartaz e um “teimoso” (sic), os quais referem expressamente o preço de € 25. Por outro lado, a PT confunde o preço do produto em causa e o preço do serviço ao qual o produto permite aceder, os quais referem realidades distintas.
- CAMPANHA INTERNET
Qualquer consumidor médio compreende, pela leitura do texto constante do site em causa, que deve pagar o preço de € 25 para aceder ao serviço ”Voz Teledeconto Relax”, o que lhe garante a gatuitidade das chamadas locais à noite, fins de semana e feriados, pelo período de um ano. Trata-se de publicidade comparativa que respeita todos os dispositivos legais e éticos aplicáveis, não induzindo em erro o consumidor.
2. Enquadramento e Fundamentação Ético-Legal
2.1. Regime de afixação de preços nas lojas de retalho
O Decreto-Lei nº 138/90, de 26 de Abril, regula a afixação do preço nos estabelecimentos de venda a retalho. As lojas WORTEN são, patentemente, estabelecimentos de venda a retalho e estão, assim, sujeitas ao regime imposto pelo normativo acima referido. Acontece, porém, que as lojas WORTEN não são parte neste processo, pelo que o JEP não pode apreciar a conformidade das suas práticas de afixação de preços às normas constantes do referido diploma.
2.2. Publicidade Comparativa
O artigo 16º, número 1, do CPUB define como comparativa a “publicidade que identifica, explícita ou implicitamente, um concorrente ou os bens ou serviços oferecidos por um concorrente”..
É, manifestamente, este o caso em apreço, na medida em que todos os materiais em causa, com excepção dos de natureza estritamente informativa ou administrativa ( proposta de adesão, condições gerais para a prestação de serviço fixo de telefone, envelope RSF) identificam, expressamente, o concorrente objecto da comparação pelo nome “PT Comunicações” ou “Portugal Telecom”.
2.3. Publicidade Enganosa
De acordo com o artigo 15º do CCI, “A publicidade que contenha comparações deve ser apresentada de modo a que a comparação não induza ou seja susceptível de induzir em erro e deve obedecer aos princípios da leal concorrência”, devendo os pontos de comparação “ser baseados em factos que possam ser comprovados e devem ser relevantes e honestamente seleccionados”.
Por outro lado, dispõe o CPUB que a publicidade comparativa só é consentida desde que respeite as várias condições que vêm estabelecidas no número 2 do seu artigo 16º, nomeadamente, desde que “não seja enganosa” (cfr. alínea a) do mencionado preceito).
Nos termos do número 1 do artigo 14º do do CCI, que tem correspondência nos artigos 10º e 11º do CPUB, a publicidade «deve proscrever toda a declaração ou apresentação visual que, directa ou indirectamente, por via de omissões ou ambiguidades, bem como por virtude de todos e quaisquer exageros apresentados, seja susceptível de induzir em erro o destinatário”, nomeadamente quanto ao “valor do bem ou serviço e o preço total a ser pago efectivamente “ (cfr. alínea b) do mencionado nº 1 do artigo 14º do CCI).
Para além dos casos de mentira pura e simples, o que caracteriza a publicidade enganosa é que a mensagem publicitária veiculada – quer ela consista numa declaração oral ou escrita, quer numa representação visual – seja produzida em termos de tal forma ambíguos que seja susceptível de induzir em erro o seu destinatário.
Por destinatário entende este Júri que se deve tomar em consideração a jurisprudência comunitária, nomeadamente, o Acordão do Tribunal de Justiça proferido no processo C-220/98, de 13 de Janeiro de 2000 (Estée Lauder Cosmetics contra Lancaster Group) na parte em que se refere que, «no quadro da interpretação da Directiva 84/450, aquando da avaliação, por um lado, do risco de engano dos consumidores e, por outro, das exigências da livre circulação das mercadorias, o Tribunal de Justiça declarou que, para determinar se uma denominação, marca ou indicação publicitária é ou não enganosa, se deve ter em conta a presumível expectativa de um consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido (v., nomeadamente, o acórdão de 16 de Julho de 1998, Gut Springenheide e Tusky, C-210/96, Colect., p. I-4657, n.-31)».
Ora, no que respeita ao anúncio na Internet, o preço de adesão ao serviço publicitado, € 25, é claramente referido, em simultâneo com a indicação da gratuitidade, pelo período de um ano, das chamadas locais à noite, fins de semana e feriados nacionais. Gratuitidade à qual se acede através da adesão ao serviço em causa e do pagamento do respectivo preço. Tal é o entendimento que se deve presumir ter o consumidor médio, na acepção acima referida, não se lobrigando outra interpretação que aponte para diferente sentido. É certo que se pode arguir existir contradictio in adjecto entre a expressão “grátis” e a referência ao preço de € 25 ; mas tal contradição não prejudica a correcta compreensão da mensagem e integra-se nos usos geralmente aceites na linguagem publicitária de tipo sugestivo, como é o caso em análise.
Não colhe, também, a alegação da PT de que o preço mencionado de € 25 não respeita “as regras referidas no decreto-lei 138/90 em especial a referência a taxas e impostos”.
O que o Decreto-Lei nº 138/90, de 26 de Abril exige, efectivamente, é que seja sempre indicado o preço total expresso em moeda com curso legal em Portugal, incluindo taxas e impostos, não sendo necessário a expressa discriminação dos quantitativos parcelares envolvidos.
No que respeita à caixa ou embalagem do produto em causa e ao folheto distribuido pela NOVIS nas lojas WORTEN, cumpre, na verdade, dizer que qualquer consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido não espera poder retirar e apropriar-se de qualquer produto presente nos escaparates de um estabelecimento de retalho sem que tenha de proceder ao respectivo pagamento. Não há, aliás, salvo erro ou omissão, exemplo algum que possa contrariar este entendimento, a não ser em contextos totalmente alheios ao do universo comercial, os quais, naturalmente, não relevam no caso sub judice. A PT confunde, assim, o preço por que o produto em causa se encontra à venda nas lojas WORTEN e o custo do serviço que, devidamente activado através dos respectivos mecanismos de adesão, o consumidor pode passar a usufruir. Nem se diga que a factura/recibo da WORTEN, nº 515018697, de 5 de Maio de 2004, relativa à aquisição de uma embalagem do produto em causa pelo consumidor Rui Manuel C. Carvalho e junta à queixa pela PT, vem em abono da tese defendida pela parte queixosa. Pelo contrário, este documento apenas confirma o que este Júri tem por óbvio, a saber, que qualquer produto em venda numa superfície comercial só pode ser apropriado por qualquer cliente desde que seja pago o respectivo preço.
Por outro lado, nada obriga os fabricantes ou anunciantes, a não ser nos casos expressamente previstos na Lei, a apor ou referir o preço dos seus produtos nas respectivas embalagens ou nos materiais publicitários que utilizem. É, assim, irrelevante, o facto do preço do produto em causa não constar da caixa do “Teledesconto Relax” e do folheto feito distribuir pela NOVIS, não tendo aplicação o disposto no art.º 6º, nº 1 do Decreto-Lei 138/90.
3. Deliberação
Termos em que a Segunda Secção do Júri de Ética Publicitária do ICAP delibera no sentido de que os materiais de comunicação publicitária em apreciação no presente processo não ofendem o disposto no Código de Conduta do ICAP, nem a demais legislação invocada pela Queixosa.
Votou vencida a Dra. Ana Moita dos Santos que formulou a seguinte declaração de voto:
«Votei contra a deliberação supra na parte respeitante ao folheto (cfr. Doc. 2 junto com a queixa) na medida em que entendo que o mesmo, ao omitir o preço de aquisição de 25 € do produto denominado por “Voz Teledesconto Relax” - preço esse que é indispensável pagar para aceder ao serviço anunciado e, consequentemente, beneficiar da gratuitidade publicitada - limitando-se a anunciar “Um ano grátis de chamadas locais à noite, fins de semana e feriados nacionais”, é susceptível de induzir em erro os consumidores quanto «ao valor do bem ou serviço e o preço total a ser pago efectivamente», desta forma consubstanciando publicidade enganosa, no termos do artigo 14º, nº1, alínea b) do Código de Conduta do ICAP.
Por outro lado, o folheto em causa, ao omitir o já mencionado preço de 25 €, não cumpre, igualmente, o disposto no nº 1 do art. 6º do D.L. nº 138/90 na parte em que este estabelece que a publicidade que refira preços (e, neste caso, refere-se que um determinado serviço é gratuito, logo, sem preço quando, afinal, é obrigatório pagar 25 € para dele usufruir) deve incluir, de forma clara e visível, o preço total expresso em moeda com curso legal em Portugal.»».
A Segunda Secção do Júri de Ética Publicitária do ICAP