Descrição geral
A formação inicial para juízes dos tribunais judiciais e dos tribunais administrativos e fiscais, assim como de procuradores, é prestada pelo Centro de Estudos Judiciais (CEJ). A Lei n.º 2/2008, de 14 de janeiro, rege o ingresso na carreira de juízes e procuradores, a sua formação e a estrutura e funcionamento do CEJ.
Acesso à formação inicial
O ingresso à formação inicial efetua-se através de concurso público, publicado no jornal oficial (Diário da República), e envolve diversos métodos de seleção. São requisitos de admissão a esse concurso:
-
ser cidadão português ou cidadão dos Estados de língua portuguesa com residência permanente em Portugal a quem seja reconhecido, nos termos da lei e em condições de reciprocidade, o direito ao exercício das funções de magistrado;
-
possuir:
i) Licenciatura em Direito de cinco anos ou grau académico equivalente reconhecido em Portugal;
ii) Licenciatura obtida ao abrigo do Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de março, seguida de conclusão, com aproveitamento, da parte curricular dos cursos de mestrado ou de doutoramento em área do Direito obtidos em universidade portuguesa, ou grau académico e parte escolar equivalentes reconhecidos
em Portugal;
iii) Licenciatura obtida ao abrigo do Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de março, ou grau académico equivalente reconhecido em Portugal, acompanhada de experiência profissional na área forense, ou em outras áreas conexas, relevante para o exercício das funções de magistrado, de duração efetiva não inferior a cinco anos;
-
não se encontrar a frequentar curso de formação inicial teórico-prático de magistrados ou a subsequente fase de estágio; e
-
reunir os demais requisitos gerais de provimento em funções públicas.
Aquando da apresentação de candidatura os interessados devem declarar expressamente a sua opção pela magistratura judicial ou pela magistratura do Ministério Público e, para o caso de não obterem vaga na magistratura escolhida, se pretendem utilizar vaga disponível na outra magistratura.
Os candidatos são selecionados através de provas escritas, provas orais e um exame psicológico de seleção. As provas escritas e orais são prestadas sucessivamente e comportam natureza eliminatória.
A fase escrita visa avaliar, designadamente, a qualidade da informação transmitida pelo candidato, a capacidade de aplicação do Direito ao caso, a pertinência do conteúdo das respostas, a capacidade de análise e de síntese, a simplicidade e clareza da exposição e o domínio da língua portuguesa.
A fase escrita do concurso para os tribunais judiciais compreende a realização das seguintes provas de conhecimentos:
-
Uma prova de resolução de casos de direito civil e comercial e de direito processual civil;
-
Uma prova de resolução de casos de direito penal e de direito processual penal;
-
Uma prova de desenvolvimento de temas culturais, sociais ou económicos.
-
A fase escrita do concurso para o preenchimento de vagas de juízes dos tribunais administrativos e fiscais compreende a realização de uma prova de resolução de casos de direito e processo administrativo e tributário e uma prova de desenvolvimento de temas culturais, sociais ou económicos.
São admitidos à fase oral os candidatos que obtiverem classificação igual ou superior a 10 valores em cada uma das provas que integram a fase escrita.
A fase oral visa avaliar, designadamente, os conhecimentos jurídicos do candidato, a capacidade de crítica, de argumentação e de exposição, a expressão oral e o domínio da língua portuguesa. 2
A fase oral compreende a realização das seguintes provas de conhecimentos:
- Uma discussão sobre temas de direito constitucional, direito da União Europeia e organização judiciária;
- Uma discussão sobre direito civil e direito processual civil e direito comercial;
- Uma discussão sobre direito penal e direito processual penal;
- Uma discussão sobre temas de direito da família e das crianças ou de direito do trabalho, de acordo com a escolha do candidato, feita no momento da candidatura.
A fase oral para o preenchimento de vagas de juízes dos tribunais administrativos e fiscais compreende a realização das seguintes provas de conhecimentos:
- Uma discussão sobre temas de direito constitucional, direito da União Europeia e organização judiciária;
- Uma discussão sobre direito civil e direito processual civil;
- Uma discussão sobre temas de direito administrativo e de direito tributário;
- Uma discussão sobre procedimento e processo administrativo e tributário.
São admitidos a exame psicológico de seleção os candidatos que obtiverem classificação igual ou superior a 10 valores em todas as provas de conhecimentos que integram a fase oral.
O exame psicológico de seleção consiste numa avaliação psicológica realizada por entidade competente e visa avaliar as capacidades e as características de personalidade dos candidatos para o exercício da magistratura, mediante a utilização de técnicas psicológicas. O resultado desse exame é expresso através de parecer escrito, traduzido pelas menções de «favorável» ou de «não favorável», sendo aprovados os candidatos que obtiverem a menção «favorável».
A classificação final do candidato aprovado é o resultado da média aritmética simples da classificação obtida na fase escrita e da classificação obtida na fase oral. Os candidatos aprovados são ordenados por ordem decrescente da respetiva classificação final. Ficam habilitados para a frequência do curso teórico-prático imediato os candidatos aprovados, aqui se incluindo os da reserva de recrutamento, por ordem de graduação, até ao preenchimento do total das vagas em concurso. Os candidatos aprovados e assim habilitados a frequentar o curso de formação teórico-prática assumem o estatuto de «auditores de justiça».
Formato e conteúdo da formação inicial
A formação inicial de magistrados para os tribunais judiciais e para os tribunais administrativos e fiscais compreende, em cada caso, um curso de formação teórico-prática, organizado em dois ciclos sucessivos, e um estágio de ingresso.
O 1.º ciclo do curso integra uma formação teórico-prática, conjunta para auditores de justiça destinados à magistratura judicial e do Ministério Público, salvo se o curso for destinado exclusivamente a uma das magistraturas, que se realiza na sede ou noutras instalações do CEJ, sem prejuízo de estágios intercalares de curta duração nos tribunais. O 1.º ciclo tem início no dia 15 de setembro subsequente ao concurso de ingresso e termina no dia 15 de julho do ano seguinte.
No 1.º ciclo, o curso compreende, na componente formativa geral comum, nomeadamente, as seguintes matérias: a) Direitos Fundamentais e Direito Constitucional; b) Ética e deontologia profissional; c) Instituições e organização judiciárias; d) Metodologia e discurso judiciários; e) Organização e métodos e gestão do processo; f) Línguas estrangeiras, numa perspetiva de utilização técnico-jurídica; g) Tecnologias de informação e comunicação, com relevo para a prática judiciária.
Tratando-se de curso para ingresso nas magistraturas dos tribunais judiciais, o curso compreende ainda, nomeadamente, as seguintes matérias: a) Na componente formativa de especialidade: i) Direito Europeu; ii) Direito Internacional, incluindo cooperação judiciária internacional e Convenção sobre os Direitos da Criança; iii) Direito da Concorrência e de Regulação Económica; iv) Direito Administrativo substantivo e processual; v) Contabilidade e Gestão; vi) Psicologia Judiciária; vii) Sociologia Judiciária; viii) Medicina Legal e Ciências Forenses; ix) Investigação Criminal e Gestão do Inquérito; x) Direitos humanos; xi) Violência de género, nomeadamente violência doméstica. b) Componente profissional, nas seguintes áreas: i) Direito Civil, Direito Comercial e Direito Processual Civil; ii) Direito Penal e Direito Processual Penal; iii) Direito Contra-ordenacional substantivo e processual; iv) Direito da Família e das Crianças; v) Direito substantivo e processual do Trabalho e Direito da Empresa.
Tratando-se de curso para ingresso nos tribunais administrativos e fiscais inclui, nomeadamente: a) Na componente de especialidade, as matérias de: i) Direito Europeu, incluindo Direito Administrativo Europeu, substantivo e processual; ii) Direito Internacional, incluindo cooperação judiciária internacional; iii) Organização administrativa; iv) Contabilidade e Gestão; v) Psicologia Judiciária; vi) Sociologia Judiciária; vii) Direito da Concorrência e da Regulação Económica; viii) Direito do Urbanismo e do Ambiente; ix) Contratação Pública; x) Contencioso Eleitoral; xi) Responsabilidade extracontratual do Estado; xii) Direito Contra-ordenacional substantivo e processual; xiii) Princípios de Contabilidade Financeira e Fiscal; xiv) Regimes jurídicos dos impostos; xv) Direito aduaneiro e contencioso aduaneiro; b) Na componente profissional, as áreas de: i) Direito Administrativo substantivo e processual; ii) Direito Tributário substantivo e processual; iii) Direito Civil, nos domínios dos contratos e da responsabilidade civil; iv) Direito Processual Civil declarativo comum e executivo.
O 2.º ciclo do curso de formação teórico-prática e o estágio de ingresso decorrem nos tribunais, no âmbito da magistratura escolhida. O 2.º ciclo tem início no dia 1 de setembro subsequente ao fim do 1.º ciclo e termina no dia 15 de julho do ano seguinte.
O 2.º ciclo decorre, consoante o caso, nos tribunais judiciais de 1.ª instância ou nos tribunais administrativos de círculo e tribunais tributários. Compreende a participação dos auditores de justiça, segundo a orientação do respetivo formador, nas atividades respeitantes à magistratura escolhida, competindo-lhes, nomeadamente: a) Elaborar projetos de peças processuais; b) Intervir em atos preparatórios do processo; c) Coadjuvar o formador nas tarefas de direção e instrução do processo; d) Assistir às diversas diligências processuais, em especial no domínio da produção de prova, da audição de pessoas e da realização de audiências; e) Assistir às deliberações dos órgãos jurisdicionais.
Só os auditores de justiça aprovados no curso de formação teórico-prática são admitidos ao estágio e são nomeados juízes ou procuradores da República em regime de estágio pelo Conselho Superior da Magistratura, pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais ou pelo Conselho Superior do Ministério Público, conforme o caso.
Os tribunais de realização do estágio são escolhidos pelos auditores. O estágio tem a duração de 12 meses, com início no dia 1 de setembro subsequente à aprovação no curso de formação teórico-prática. Os magistrados em regime de estágio exercem com a assistência de formadores, mas sob responsabilidade própria, as funções inerentes à respetiva magistratura, com os respetivos direitos, deveres e incompatibilidades, e desenvolve-se progressivamente, com complexidade e volume de serviço cr.
Fim da formação inicial e processo de qualificação
No termo do 1.º ciclo, os auditores de justiça são avaliados, classificados e graduados. Têm aproveitamento os auditores de justiça que obtenham classificação igual ou superior a 10 valores no conjunto das componentes formativas, em conformidade com os critérios de ponderação estabelecidos para cada matéria ou área no respetivo plano de estudo. Os considerados não aptos não transitam para o 2.º ciclo.
No termo do 2.º ciclo, os auditores de justiça são novamente avaliados, classificados e graduados. Têm aproveitamento os auditores de justiça que obtenham classificação igual ou superior a 10 valores. Os considerados não aptos são excluídos.
Para determinação da classificação final individual e graduação no curso de formação teórico-prática, considera-se a seguinte ponderação:
-
A classificação final do 1.º ciclo vale 40 %;
-
A classificação final do 2.º ciclo vale 60 %.
Durante o estágio os Conselhos Superiores da Magistratura, dos Tribunais Administrativos e Fiscais e do Ministério Público recolhem elementos sobre a idoneidade, o mérito e o desempenho do magistrado em regime de estágio, devendo o CEJ prestar-lhes, periodicamente, as informações adequadas. Terminada a fase de estágio, os magistrados são nomeados em regime de efetividade. O Conselho Superior respetivo não procede à nomeação em regime de efetividade quando, de acordo com os elementos colhidos e ouvido o conselho pedagógico do CEJ, concluir pela sua falta de adequação para o exercício da função.